Mostrando postagens com marcador greco-romano. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador greco-romano. Mostrar todas as postagens

Athena e Aracne - Parte final






Tal presunção era mais do que a paciência da deusa pudesse suportar. No mesmo instante, gritou, furiosa:

— Comecemos agora mesmo este concurso! Vou provar tua inferioridade perante a minha sabedoria e poder. Que os Deuses se façam presentes para testemunhar a sua derrota. Mulher miseravel, tu nunca mais bordarás novamente.

As duas mostravam-se extremamente arrogantes e confiantes. Não se podia saber qual seria a vencedora daquele empolgante confronto. Com as ferramentas prontas e a lã separada igualmente, ao sinal da Deusa, as duas começaram a trabalhar. Os dedos ágeis desfiavam a lã e a colocavam rapidamente sob os pentes do tear que tinham à frente. Os fios deslizavam entre os dedos, esticados ao máximo, parecendo as cordas afinadas de um piano. Nem bem saíam da máquina e dedos os capturavam, comprimindo-os sob as agulhas douradas. As mãos tocavam a laçadeira com movimentos rápidos e graciosos. Como se estivessem dançando ao som de melodias celestiais, seus dedos corriam ágeis entre as bobinas coloridas, colocando fio por fio na posição exata. Durante três dias, as concorrentes não pararam nem para comer ou dormir, sob os olhos atentos dos deuses. Ao final do quarto dia, Athena e Aracne terminaram o trabalho diante de Ninfas, deuses e alguns mortais, que estavam ali para o julgamento.

O bordado da deusa Athena era perfeito. Trabalhado com uma perícia sem igual, via-se a Acrópole de Athenas. Lá estavam reunidos todos os deuses do Olimpo, votando para quem deveriam entregar a proteção da cidade de Cécrops: a Athena ou a Posseidon. Nos quatro cantos do grande retrato principal, ela teceu quatro pequenos quadros que retratavam casos de pura arrogância humana e sua punição pelos deuses. Em um, via-se o rei trácio Hémos com sua mulher Ródope, que chamavam-se de Zeus e Hera e foram transformados em montanhas; em outro canto, via-se a infeliz mãe dos pigmeus que, vencida por Hera, foi transformada em garça e obrigada a lutar com seus próprios filhos; no terceiro quadrado estava Antígone, a belíssima filha de Laómedon, que se orgulhava tanto de sua beleza e de seus cabelos que se comparava a Hera e, por isso, teve seus cabelos transformados em serpentes que mordiam durante todo o dia até que Zeus, apiedado, a transformou em cegonha; por fim, retratou Cíniras lamentando o destino de suas filhas, que haviam excitado o ódio de Hera com seu orgulho... A deusa as transformou em degraus de seu próprio templo. Todos esses retratos foram rodeados com uma coroa de folhas de oliveira.

Athena, sem olhar o trabalho de Aracne, já se sentindo vitoriosa, desafiou, mostrando o seu:

— O que haveria de mais criativo e belo para se bordar?

Todos bateram palmas e reconheceram quão maravilhosa ficara a sua arte. Foi então que Aracne mostrou sua obra. Todos fizeram silêncio por alguns minutos. Boquiabertos, eles pareciam enfeitiçados com tamanho esplendor.

— É magnífico! Esplêndido!

Em seu tear, Aracne havia tecido uma cena representando os deuses dominados por sua fraqueza e baixos instintos. Cada detalhe na tapeçaria era um insulto aos deuses do Olimpo. Especialmente, bordara o poderoso Zeus e todos os seus amores proibidos. Aracne ousou ilustrar Zeus sob a forma de touro, arrebatando Europa; sob a forma de águia, abordando Astéria; sob a forma de cisne, conquistando Leda; sob a forma de sátiro, fazendo amor com Antíope. Zeus fazendo-se passar por Anfitríon para seduzir Alcmene, mãe de Heraclés; disfarçando-se de pastor para fazer amor com Mnemosine, mulher-titã; e, ainda, Zeus conquistando Egina, Deméter e Danae, disfarçado de chama, serpente e chuva de ouro, respectivamente. Todos os gráficos foram rodeados por uma coroa de louros com pequenas flores harmoniosas. A jovem estava emocionada com o resultado. Nem ela imaginava que fosse capaz de tal perfeição.

— Tende coragem de aplaudir esta mulher? Ela está ofendendo o poderoso Zeus! Olhai para isto e julgai!

E, como ninguém lhe dava ouvidos, inclusive Hera, que deveria aborrecer-se por tamanha ousadia, Athena puxou sua espada e disse zangada:

— Que pena! Mas que esta seja uma lição para que todos aprendam que a arte nasce do Amor e não da Provocação!

Agarrou a tapeçaria de Aracne e a fez em mil pedaços. A jovem artista gritou, blasfemou, chorou, vendo o trabalho de sua vida destruído pela cólera da Deusa. Não conseguindo suportar tamanha humilhação, correu para fora em desespero à procura da morte. À medida em que Athena rasgava e picotava trabalho tão magnifico, sua raiva ia diminuindo. Por fim, voltando a si, envergonhada, viu o que sua cólera havia provocado. Voltou-se para procurar Aracne e a encontrou pronta para saltar nos braços da morte. Com pena de moça, no momento em que a jovem iria se enforcar, Athena sustentou-a no ar, impedindo que se estrangulasse e, em seguida, derramou sobre Aracne fluídos retirados das ervas da deusa Hécate. A corda transformou-se num fio translúcido e a mortal sentiu que a cabeça e o corpo lhe diminuíam de volume; minúsculas patas lhe substituíram os braços e as pernas, e o resto do corpo se transformou num enorme ventre.

— Viverás, Aracne, mas ainda assim serás punida pela ousadia em querer ridicularizar meu pai. Ficarás para sempre pendurada desta maneira; este será o teu castigo e de toda a tua posteridade.

Já ia dando as costas para se retirar, quando percebeu um ruído vindo da árvore. Voltou-se e viu que a criatura negra movimentava suas pernas com extraordinária agilidade, costurando um manto com uma seda extremamente fina, que retirava de seu dorso abaulado. Aos poucos, Athena viu surgir diante de seus olhos um magnífico bordado circular, que excedia a tudo que ela antes já fizera, como se Aracne, mesmo sob aquela odiosa forma, tivesse se tornado ainda mais talentosa, com seus diversos braços. A Deusa percebeu que, apesar da arrogância e soberba tê-la corrompido, o amor da jovem pela sua arte era puro e verdadeiro. Mesmo naquela forma diminuta e decadente, ela continuava dedicando sua vida a tecer. Do Olimpo, Athena zelaria por ela, pois o tear de Aracne ainda contianuaria encantando as Ninfas, os deuses e os homens por muito tempo.

Athena e Aracne Parte I







Muito se fala que Athena é uma Deusa branda, serena e amante da beleza e da perfeição. Sempe guiada pela sabedoria, prudência, capacidade de reflexão e poder mental. Mas, contavam os antigos que, certo dia, no entando, asssim como o céu claro se turva em nuvens escuras e assustadoras, tbm se turvou o semblante da Deusa.


Havia em Pafos uma mulher conhecida como Aracne - dela provinha grande fama pelo belo dom 
de tecer as mais incríveis artes na tapeçaria. Ela aprimorara o seu dom com o tempo, lapidando a peça rara que estava no manusear dos fios. Até mesmo as linhas sedosas usadas por Aracne eram exepcionais, pois toda a matéria-prima era rigorosamente selecionada, cabendo apenas a mercadores persas e fenícios a honra de fornecê-las. Seus trabalhos eram tão admiráveis que pedidos chegavam dos mais ilustres personagens da história.  Aracne era a mais talentosa fiandeira do lugar e usava os torneios anuais para consolidar a sua fama. Por conta disso, a cada ano diminuía o número de mulheres interessadas em competir.  


Contudo, o que muitas vezes parece ser uma benção na vida de alguns, torna-se facilmente uma maldição. Conforme crescia a fama da tecelã, crescia também a prepotência e a soberba diante dos homens e dos deuses. O trabalho de seus aprendizes passou a lhe servir apenas de pano de trapo, independentemente do esforço ali colocado, do tempo perdido e do amor dedicado. Diante de seus olhos, somente suas próprias obras eram dignas de admiração. Acostumada aos elogios, Aracne não se dava ao trabalho de agradecê-los, muito pelo contrário, adulá-la era um requisito básico para quem desejasse alguma peça feita por tão preciosas mãos.


 - És aprendiz da divina tecelã! Que belo presente o dom que recebeste dela. 
Diziam as bocas que a enalteciam. Mas o que se tratava de um elogio, era para ela a mais terrivel das afrontas. 


 - Ora, mas isso é um absurdo. Nem mesmo a própria Deusa é capaz de tamanha beleza em seus trabalhos. 
Assim decorria em sua mente. Porém, nada dizia e, para não parecer irritada, permitia uma leve risada de desdém. Em sua mente, ela se via então elevada à condição de Deusa das artes manuais, soberana de toda magna Grécia, a dama dos fios de ouro - e outros títulos ainda mais ostensivos .


Muitos foram os dias que Athena placidamente viu-se humilhada por aquela mortal, e nos átrios de sua sabedoria lamentava por tais atitudes. No entanto, conforme a soberba e o orgulho cresciam no coração de Aracne, também crescia a impaciência de Athena. Certo dia, impelida pelos Deuses, Athena resolveu descer e acabar com toda essa arrogância. Primeiro se transformou numa camponesa idosa e bateu à porta da tecelã que atendeu, surpresa. A senhora, muito humildemente disse:


 - Aconselho-a a ser mais discreta minha jovem. Não desafie a honra dos deuses, pois certamente, em algum momento, a ira de algum deles cairá sobre ti. 


 Aquelas palavras, a seu ver, mais pareciam insultos do que conselhos. Cega pela raiva, vociferou: 


 - Que a senhora guarde seus conselhos para as filhas pobres e inúteis que tens. Ora, e que méritos teria eu se devo exclusivamente a ela meus talentos? A nada devo agradecer, se não aos meus anos de esforço e trabalho para chegar a tais resultados. Sou melhor tecelã que ela. Se não, porque então ela evita competir comigo?


Um vento forte e frio de congelar os ossos inundou o lugar, e a voz quase sumida da senhorinha deu lugar a uma voz poderosa e cheia de autoridade:
  
- É esta, então, a idéia que tens de mim, atrevida?!


Disse Athena. E então se desfez do disfarce, surgindo em todo o seu esplendor diante da tecelã e das pessoas que ali estavam. Alguns recuaram assustados, enquanto outros se prostraram diante da Deusa, respeitosos. Aracne, contudo, não se mostrou tão impressionada, continuou de pé com semblante arrogante, encarando a Deusa nos olhos. Nos instantes intermináveis em que o olhar das duas se cruzavam, Aracne se perdia em pensamentos de como desmoralizar a Deusa numa disputa. Como fazer com que as pessoas que se ajoelhavam diante de Athena, no futuro, viessem a se ajoelhar diante dela? Tão logo pensou nisso, propôs o desafio à Deusa e, tamanha era a sua confiança, que assegurou que estava disposta aos seus castigos caso perdesse.